sexta-feira, 21 de junho de 2013

Biólogo e análises clínicas: A guerra fria entre formações profissionais

 

Por: Carlos Gilberto Melchior Rodrigues Sansalone Ferrari
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Briga entre biólogos X farmacêuticos
 

O biólogo nas análises clínicas enfrenta um tabu: farmácia e biomedicina querem vetar sua atuação. Os biólogos defendem que são legitimamente habilitados e têm competência para exercer análises clínico-laboratoriais, mas profissionais e conselhos de farmácia e biomedicina tentam vetar judicialmente essa atuação, surgindo, assim, uma verdadeira “guerra fria” entre essas áreas. Afinal, qual tem mesmo competência e legitimidade para atuar nos laboratórios?

 Os argumentos de quem é contra

      - Biomedicina

O Conselho Regional de Biomedicina (CRBM) 1ª Região, do Distrito Federal, tem uma página interna em seu site intitulada “Biólogos Fora das Análises Clínicas”, que reprime veementemente a atuação do biólogo em análises clínicas e diz que certas atribuições são exclusivas do CRBM, expondo uma decisão jurídica de juiz federal:
“(...) o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de caber tão-só ao Conselho de Biomedicina a fiscalização da aludida atividade (juiz Aloísio Palmeiras Lima). Julgo o pedido procedente para declarar a nulidade da resolução 10/06 do CFB no que pertine à conferência de atribuição ao biólogo de realizar análises clínico-laboratoriais e condenar o réu a não editar ato normativo com o mesmo conteúdo sob pena de multa de R$1.000,00"

Juíza Federal Raquel Soares Chiarelli, 21ª Vara do Distrito Federal. (Internet: http://www.crbm1.com.br/biologos_fora.asp. Acesso: 7 de junho, 2013)

 A decisão ainda discorre sobre a possibilidade de multa, caso o Conselho Regional de Biologia emita qualquer autorização para biólogos atuarem e responderem por laboratórios.

      - Farmácia

Na mesma linha de argumentação, o Conselho Regional de Farmácia do Ceará lançou um comunicado de título “Biólogos não podem exercer análises clínicas”, em 2010, que interpreta a seu favor uma decisão do Supremo Tribunal Federal. Observa-se que a justificativa é baseada no trecho a seguir, principalmente na parte em negrito do texto:

“As análises clínicas são inerentes apenas aos médicos (patologista), farmacêuticos e biomédicos(...).
       

O intérprete maior já pacificou o tema:
STF - Supremo Tribunal Federal
Rp – REPRESENTAÇÃO 1256/DF
DJ 19-12-1985 PP-23622 EMENT VOL-01405-01 PP-00107
Relator OSCAR CORRÊA
 Ementa REPRESENTAÇÃO - PORTADORES DO DIPLOMA DE CIENCIAS BIOLÓGICAS, MODALIDADE MÉDICA. NÃO É POSSIVEL RESTRINGIR-LHES O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ANÁLISE CLÍNICO-LABORATORIAL ENQUANTO O CURRÍCULO DA ESPECIALIDADE CONTIVER AS DISCIPLINAS QUE O AUTORIZAM (...).”

(Internet: http://www.crfce.org.br. Acesso: 7 de junho, 2013)

 Nesse caso, a justificativa é infundada. Essa representação foi feita para defender que os biomédicos também têm o direito, competência e legitimidade para atividades de análise clínico-laboratorial e dispõe sobre outros temas. Além de não fazer qualquer menção, em momento algum, sobre o impedimento do biólogo em fazer análises clínicas, o documento ainda diz no voto final que “É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer”
(STF. Internet: http://www.jusbrasil.com.br/filedown/dev3/files/JUS2/STF/IT/RP_1256_DF_1278789663559.pdf).

– Esse tipo de publicação mostra como existe uma real batalha contra os direitos do biólogo em realizar atividades relacionadas a análises clínicas.
 O Conselho Federal de Farmácia também se manifesta contra o biólogo exercer atividades em análises clínicas e argumenta que apenas farmacêuticos e biomédicos têm esse direito. Mais uma vez, as palavras deixam claro que as interpretações das leis não fazem sentido:

“O Presidente do CFF, Jaldo de Souza Santos, afirma que, de acordo com as leis federais que regulam a Farmácia e a Biomedicina, o exercício das análises clínico-laboratoriais é de competência dos biomédicos, farmacêuticos-bioquímicos e médicos patologistas. E lembra, ainda, que de acordo a Lei 3820/60 – que dispõe sobre a criação dos Conselhos Federal e Regionais de Farmácia – ‘é atribuição dos profissionais farmacêuticos, ainda que não privativa ou exclusiva, a responsabilidade técnica e o desempenho de funções especializadas em órgãos ou laboratórios de análises clínicas ou de saúde pública ou seus departamentos especializados”

 Observa-se que no trecho em negrito é nítida a controvérsia entre o argumento apresentado pelo CFF e o que está escrito, ou seja: se a atribuição mencionada acima não é privativa ou exclusiva dos profissionais farmacêuticos, outros profissionais podem ter a mesma atribuição, desde que sejam habilitados para isso, ou suas capacidades curriculares permitam.

 Competência e legitimidade do biólogo em análises clínicas

Os cursos de Ciências Biológicas, com ou sem modalidade médica, abrangem exatamente as mesmas matérias e disciplinas no conteúdo de análises clínicas para formar médicos, bioquímicos e biólogos.

 Sendo assim:

     1. Segundo o Ministério da Educação e Cultura (MEC), entre os conteúdos básicos do curso de Ciências Biológicas, seja modalidade médica ou não, seja Licenciatura ou Bacharelado, estão:
“BIOLOGIA CELULAR, MOLECULAR E EVOLUÇÃO: Visão ampla da organização e interações biológicas, construída a partir do estudo da estrutura molecular e celular, função e mecanismos fisiológicos da regulação em modelos eucariontes, procariontes e de partículas virais, fundamentados pela informação bioquímica, biofísica, genética e imunológica. Compreensão dos mecanismos de transmissão da informação genética, em nível molecular, celular e evolutivo.”
Item “4.1” das Diretrizes Curriculares para o Curso de Ciências Biológicas, que constam no Parecer número CNE/CES 1.301/2001 do MEC (Internet: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES1301.pdf. Acesso em 7 de junho, 2013)

      2. O documento que o CFF usou para se manifestar contra os biólogos, já citado acima, ainda traz a passagem “a capacitação profissional decorre da habilitação nas disciplinas compreendidas no curso respectivo e que o exercício de análises clínico-laboratoriais não é privativo de qualquer especialidade.” (STF. Internet: http://www.jusbrasil.com.br/filedown/dev3/files/JUS2/STF/IT/RP_1256_DF_1278789663559.pdf).
 Por isso, analisando os documentos e argumentos, a atuação do biólogo é indiscutivelmente legítima na realização de análises clínico-laboratoriais.
 Isso significa que a intenção de vetar a competência da do licenciado ou bacharel em Ciências Biológicas de qualquer modalidade é incoerente e infundada, ao menos até agora. De qualquer forma, o impasse continua e essa guerra fria para ver quem manda parece não ter fim.

Fonte: PORTAL EDUCAÇÃO

2 comentários:

Unknown disse...

Olá Professor Sandro, felicidades para toda sua casa!

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Sandro C.Mattos disse...

Muito bom. Como fazer isso?